sexta-feira, 17 de maio de 2013

Na ilha de Miyajima

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Saindo do Memorial da Paz, fui jantar num restaurantezinho pequeno com ar de boteco no centro de Hiroshima. Um dos donos estava por trás do balcão e o outro sentava numa das mesas, com uma toalha branca jogada sobre o ombro, limpando a mão e assistindo televisão (visualizou?). Como em quaisquer desses lugares no Japão, ninguém fala inglês. O jeito é ir pelas figuras do cardápio ou arriscar-se a uma das inúmeras sopas de macarrão em que você não sabe exatamente o que vem dentro. Os riscos não são tão altos, mas pode ser que venha algo tipo ovo cru, cabeça de peixe, ou uma bela posta de lombo  o que eu como vegetariano não ia curtir, mas que eles aqui adoram, apesar de todo o nosso estereótipo de que japonês só come peixe. Mas nesse dia consegui evitar todos: acabei recebendo algo com legumes e bastante pimenta.

Depois fui ao albergue, que não tinha nada de extraordinário (nem Hiroshima, diga-se de passagem, afora o Memorial da Paz), mas era confortável, assim como Hiroshima também é arrumadinha. A recepcionista, com seus 1,75m, deve ser tratada como uma gigante no Japão, onde as pessoas tendem a ser baixinhas. O melhor de tudo foi um mapa múndi onde ela me pediu que eu marcasse o lugar de onde eu era. Descobri como se escreve "Feira de Santana" em japonês. Confiram abaixo.
Óbvio que eu era o primeiro feirense a pisar lá. Está logo ali, a noroeste do pino amarelo mais alto (Salvador).

Ela leu pra mim Feira de Santana com sotaque japonês, e disse "É isso mesmo", com aquele sorriso e aquela cara feliz que só asiáticos conseguem fazer.

O dia seguinte prometia ser mais alegre que a minha visita ao Memorial da Paz. Quem vem a Hiroshima deve, por força moral e cívica, ir à ilha de Miyajima, um pequenino paraíso aqui no sul do Japão. Não há pontes até a ilha, e olha que os japoneses adoram construir coisas. Lá só se chega de ferry. A ilha é basicamente turística, com um monte a ser escalado e um templo à beira da praia.

Saí logo de manhã, para que as hordas de turistas (japoneses mesmo; raridade era ver um ocidental) não chegassem antes de mim. Comprei um chá quente de gengibre na máquina na rua e segui para a estação de trem, pra pegar um que me levasse à costa. De Hiroshima à saída do ferry não são mais que 30 minutos. Dali você já tem uma bela visão do litoral, com suas ilhas e morros ainda cobertos de vegetação.
Foto tirada do ferry, pelo litoral sul da ilha principal do Japão (Honshu).

Descendo em Miyajima, você respira um ar muito gostoso. O clima é agradabilíssimo.







Um dos grandes "tchans" da ilha é o templo à beira da praia, nessa foto acima. Quando a maré está alta ele fica todo sobre a água. Mas como nem só de ar e de belas paisagens vive o homem, eu fui  tomar café num lugar onde o sabão do banheiro era uma goma roxa onde você esfrega a mão e onde o japonês me enrolou com um "suco" que metade do copo era tomada por gelo.

Me lembrem de voltar aqui no outono. Dizem que a ilha fica coberta do laranja e vermelho das árvores de maple (aquela mesma da bandeira canadense). A folha de maple é símbolo da ilha, então aqui se fazem biscoitos, bolinhos de peixe e tudo o mais que você imaginar no formato da folha. Além da sua parte natural e quieta, a ilha tem umas ruazinhas repletas de barracas vendendo petiscos e souvenirs.
Algumas barraquinhas simples...
... outras mais arrumadas (esta vendendo pãezinhos)... 
... e este vendendo algo no formato da folha de maple e que eu acabei comprando...
... e que se revelou ser bolinho de peixe (que, se ninguém te disser, você nunca descobrirá que foi de peixe)...
... e o maravilhoso sorvete de batata-doce com pedaço de batata-doce. Delicioso.

Só evite juntar lixo aqui, pois como em muitas partes do Japão, é capaz de você andar horas sem achar uma lixeira. Mesmo assim está tudo limpo (salve a educação!). Esse copinho do sorvete e o pauzinho do bolinho de peixe eu acho que carreguei comigo por uma hora ou mais, até achar uma lixeira num banheiro público.

Me livrando deles, fui caminhar pelos templos e ver o torii (portal xintoísta) na água, uma das vistas mais fotografadas do Japão. Aqui, como em Nara, há também gazelas caminhando por toda parte e interagindo com os visitantes.
Portal xintoísta na água, uma das marcas de Miyajima.
Feito com troncos de cânfora, que é resistente ao apodrecimento.
Templo xintoísta de Itsukushima, à beira da praia.


Monja dando algo de comer à gazela.

A ilha como um todo é tida como um santuário, mantido por esse templo xintoísta local. Diz-se que eles fizeram uma grande limpeza espiritual na ilha após a Batalha de Miyajima, em 1555. Como quase todas as guerras internas no Japão, essa foi uma disputa entre clãs familiares pelo controle da região, e o resultado foram quase 5 mil mortos nesta ilha. Não sei exatamente como a limpeza espiritual aconteceu, mas hoje há a interessante regra de que ninguém pode nascer e nem morrer na ilha. Não acredito que consigam impedir ninguém de morrer subitamente aí, mas certamente não há aqui nem hospitais nem maternidades.
Pintura feita no séc XIX da Batalha de Miyajima em 1555. Percebam o templo, no mesmo lugar onde é hoje.

Literalmente, o ponto alto de Miyajima é o Monte Misen. Você pode subir o caminho inteiro a pé ou fazer como eu e pegar o bondinho, que te leva quase ao tipo e te deixa só com os 40 minutos finais de caminhada, no alto. Como eu tinha um ônibus pra pegar à noite lá em Hiroshima, não dava pra passar o dia na ilha fazendo trilha, então fui direto ao ponto. No alto há belas vistas, boas caminhadas e mais templos, como o Santuário dos Namorados.
Subida para o bondinho que leva ao alto do Monte Misen, em Miyajima.
Vista de dentro do bondinho.
Vista do alto do monte.


Santuário dos Namorados (ver abaixo).
Ali a chama queima initerruptamente há 1.200 anos, fervendo um caldeirão de água benta. Dali os casais tiram com uma concha e bebem nuns copinhos, para serem abençoados. 
  
A foto está enevoada por causa da fumaça do incenso dentro do Santuário. Lá dentro é um tanto asfixiante, mas dá pra suportar, e o cheiro é bom. Mas não, eu não cheguei a beber da água benta fervida. Você tira com uma concha e coloca nos copos pra ambos beberem. Como é algo pra casais, não achei que faria sentido beber sozinho (nem eu queria correr o risco de, de alguma forma, consolidar minha solteirice bebendo a tal água sozinho).

Dali até o pico ainda há uma caminhada breve por trilhas, com escadarias que vão fazendo você suar apesar do frio de inverno que estava.
Trilha já no alto do Monte Misen, Miyajima.

A vista do cume é, mais uma vez, recompensadora. Você fica lá sentado na pedra só olhando... e dá vontade de passar horas lá quieto, só apreciando a tranquilidade.
Vista do alto do Monte Misen, em Miyajima.
No alto do Monte Misen, em Miyajima.

Mas acabei olhando foi pro relógio, e em dado momento vi que já era hora de partir. Meu ônibus para Tóquio saía de Hiroshima hoje à noite, e eu ainda precisava fazer todo o percurso de volta.

A tarde já estava caindo quando eu retornei à parte baixa da ilha. A maré havia baixado, e olha só como eu encontrei o santuário:
Templo de Itsukushima com a maré baixa. O mesmo portal que estava na água pela manhã.

Como a caminhada havia aberto a minha fome e eu não tinha tempo para parar e fazer uma refeição, me supri de batatas doces. Eles aqui no Japão têm esse costume de vender batatas-doces cozidas ainda quentinhas, e são mesmo macias e deliciosas. Além disso, passei por uma loja lotada e não resisti  precisava ver do que se tratava. Acabou sendo uma loja de biscoitos de vários sabores, no formato da folha de maple. Além dos sabores costumeiros, como chá verde ou feijão, havia o mais exótico  que eu comprei  que foi o biscoito de carvão de bambu. O sabor é de queimado mesmo. Eu não sei como é que um negócio desse vende. Acho que só pros curiosos como eu.
O biscoito de carvão de bambu.

Terminada a minha degustação um tanto exótica, fui novamente ao ferry e fiz meu caminho de volta até Hiroshima. Meu ônibus noturno para Tóquio já estava reservado (acabou o dinheiro pra ficar passeando de trem-bala). Daqui até lá seriam 12h. Era a viagem final antes de me despedir do Japão.

Um comentário:

  1. Migo, sempre instrutivo!
    E para resolver sua solteirice, nada de beber água japonesa: pega um Sto Antonio, tira o menino Jesus, deixa ele de ponta cabeça e avisa que só vai devolver o guri e fazer ele ficar de pé se arranjar uma mulher bem legal!
    Aqui em Cascavel essa simpatia é famosa! Eu nunca tentei, acho sacanagem com o santo heheheheheh

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