Distrito de Shibuya, Tóquio. |
Tóquio é uma cidade enorme, cheia de distritos (como eles chamam os bairros), cada qual com a sua personalidade. Não é uma cidade europeia ou colonial, onde normalmente você tem o centro histórico ou algum ponto central de referência. Na prática, Tóquio não tem centro. Pra descobri-la, é preciso ver cada um dos distritos e saborear seus contrastes.
Para conhecer Tóquio não há escapatória: tem que se usar o metrô, tido como o melhor do mundo. Você acha o metrô de São Paulo amplo? Espero que não. Nem são os de Paris ou Londres, em comparação. O de Tóquio é mesmerizante.
Mapa do humilde metrô de Tóquio. |
Máquina para comprar bilhetes de metrô em Tóquio. Há um passe com o apropriado nome de Pasmo. |
No começo intimida, mas é bastante fácil de usar. Há algumas coisas que você não imaginaria — por exemplo, não tente acumular bilhetes, pois ele só pode ser usado na estação onde foi comprado. Mas você se acostuma. Ao entrar na estação, som artificial de passarinhos — os japoneses adoram essas excentricidades tecnológicas. Não é permitido falar no celular dentro do vagão para não perturbar os demais passageiros. Chegando na Europa, onde todo mundo fala alto e conversa no telefone, eu me sinto na roça. E, sim, é muita gente trafegando, inclusive de noite, já que os japoneses ficam no trabalho até 8, 9 ou 10 horas, mas neeem de longe se compara à lata de sardinha que é pegar metrô no Rio de Janeiro, trem na Índia, ou qualquer ônibus no Brasil. Por fim, há os sensacionais guardas vestidos como o Chefe Masaki e usando máscaras e luvas brancas para cirurgicamente tratar de que não haja confusão no embarque e desembarque de passageiros. Às vezes falam umas coisas que eu não entendo no microfone, e são bastante respeitosos.
Para quem não conhece o Chefe Masaki, ele era sempre o chefe de polícia em seriados japoneses dos anos 90 como Winspector e Solbrain. É esse o traje dos guardas japoneses, dentro ou fora do metrô. |
Nas ruas, outro sinal de que o Japão parece estar um passo à frente dos outros países que se dizem desenvolvidos: não é permitido fumar nas ruas. Há espaços designados para quem quiser fumar ali quieto, sem fazer da rua inteira fumantes passivos.
Sinais de proibido fumar nas ruas — ao menos nas vias de maior circulação. Há multa para quem violar. |
O quadradinho dos fumantes na rua. |
Há algumas contradições, no entanto. Não pode fumar na rua mas quase sempre pode fumar dentro dos restaurantes. Ainda estou tentando entender essa. Ao menos boa parte deles oferecem área de não-fumantes. Além disso, não pode fumar na rua mas pode-se pedalar na calçada, então no Japão você tem que ficar constantemente se desviando — ou sendo desviado — de bicicletas que passam à sua direita e à sua esquerda. Pra mim que saio de Amsterdã, onde há ciclovias por toda parte, isso é uma esculhambação. Mas enfim. Andando e aprendendo o que há de bom em cada país.
Outra coisa que te atrapalha em Tóquio — e no Japão em geral — é que as casas normalmente não tem número, e as ruas, à exceção das avenidas principais, não tem nome. Sensacional, né? Dizem que a numeração, até a Segunda Guerra Mundial, costumava ser com base em qual casa foi construída primeiro (super ideia). Depois da guerra acabaram com esse sistema e, pelo visto, até agora não houve criatividade pra se estabelecer uma nova numeração. Então, quando você precisa chegar num lugar, fulano fica lhe dizendo "vire à direita, depois à esquerda, aí quando você vir o templo você dobra...", igual em cidade do interior na época do Brasil Colônia. Hoje em dia, claro, os japoneses põem o CEP (CEP tem!) no iPhone e acham o lugar. Então não vejo muita perspectiva de mudança. Arranje o seu smart phone, tenha boa memória e senso de direção, ou se perca em Tóquio.
O inglês das pessoas aqui é mínimo, então não ache que vai poder pedir informação a menos que você fale japonês. Dito isso, ao contrário de países como a França ou a Rússia em que eles não falam inglês bem e se fazem de ofendidos como se fosse o seu dever ser fluente na língua deles, os japoneses te tratam super bem mesmo que você não fale nada de japonês. Não fazem cerimônia em usar mímica, desenhar, ou explicar devagar em japonês como se você pudesse entender (especialmente os idosos às vezes fazem isso com você, olhando fixamente e sorrindo como se você fosse um pouco devagar da cabeça).
Quando você entra numa loja em Tóquio, é costume te darem um sonoro "bem vindo": Irashaimasê. Esqueça aquela visão de um japonês cerimonioso te dando um Irashaimase cortês mas frio e sem energia. Nada disso. É um boas-vindas cheio de empolgação, daquelas que você precisa de manhã antes da primeira xícara de café. A loja toda praticamente te cumprimenta, os caixas -- ou, se for num restaurante, o tiozinho lavando prato atrás do balcão -- todo mundo. Claro, eles estão todos fora do tempo, então quando um está no "shai" outro já está no "se", então é aquela alegre cacofonia de boas vindas. E alto. Irashaimaseeeeeeeee!! (Os japoneses adoram alongar-se nas sílabas tônicas). É o mesmo quando você deixa a loja ou o supermercado: Arigato gozaimaaaaaasu! (Muito obrigado).
Agora imagine aí o meu dia típico. Acorda de manhã, cumprimenta as pessoas na recepção do albergue (inclusive a bela Ériko — eu nunca tinha visto alguém tão bonita com esse nome), e sai nas ruas de olho nas bicicletas mas agradecendo que ninguém fuma na calçada. Pára numa das inúmeras lojas de conveniência, toma um coro de irashaimases e arigatos e compra uns rolinhos de arroz pra comer (tipo uns sushis mas sem fatiar, e com recheios diversos). Sai dali, desce no metrô, ouve os passarinhos de mentira, compra o bilhete na máquina Pasmo, cumprimenta o guarda se quiser, e embarca no metrô com direção a... aonde você quiser.
Eu já mostrei um pouco do distrito de Asakusa, com o Templo Senso-Ji, e cheio de ruelinhas, casario baixo, e restaurantes simples. É uma área mais tradicional de Tóquio, em que por exemplo ainda guardam a tradição dos riquixá — aqueles fulanos que correm puxando você numa mini-carruagem.
Riquixá em Asakusa, Tóquio. Hoje em dia no Japão é algo para turistas e não mais como meio de transporte. |
Hoje em dia cobram o olho da cara (tipo 10 minutos por 50 reais), e são essencialmente para os turistas. Mas costumava ser um meio de transporte sério até o começo do século XX, normalmente com os camponeses transportando os senhores e as madames. Em países mais pobres da Ásia como o Vietnã, o Laos e o Camboja ainda se vê muito desses, e na Índia, embora não se veja mais o riquixá, eu tomei algumas vezes o ciclo-riquixá, em que o fulano te puxa pedalando numa bicicleta.
Vá para outras partes de Tóquio e o cenário muda completamente. Perto de onde foi o congresso onde participei fica Shibuya, um dos distritos mais badalados. Neons e telões por toda parte, às vezes inclusive com áudio, como se fosse uma televisão gigante ligada na rua. Deixa a Times Square de Nova York no chinelo.
Multidão em Shibuya à noite. |
Um verdadeiro arrastão de pessoas para atravessar o sinal em Shibuya. |
Shibuya. |
Se você estiver a se perguntar o que é que toda essa gente faz ali, são basicamente restaurantes, lojas de departamentos, essas coisas. Shibuya se tornou meio que ponto de encontro para os japoneses.
Não muito distante dali está o distrito de Roppongi, também badalado, onde os turistas gaijin se concentram. (Gaijin é o nome original dos japoneses para estrangeiros, soa meio que como "forasteiro", então caiu em desuso hoje e muitos o consideram politicamente incorreto). Roppongi é também onde fica a afamada Torre de Tóquio, muito conhecida de quem já assistiu animês como X ou Guerreiras Mágicas de Rayearth.
Torre de Tóquio no distrito de Roppongi à lua cheia. |
No entanto, preciso dizer que me decepcionei. A Torre de Tóquio é bem menor do que eu imaginava, e não me impressionou mais do que a antena de televisão da TV Subaé lá de Feira de Santana. É uma cópia desavergonhada da Torre Eiffel de Paris — isso todo mundo já sabe. Mas o interessante é como as torres tiveram destinos opostos. Inicialmente os franceses odiaram a Torre Eiffel, mas agora é paixão nacional. Já aqui foi o contrário, os japoneses costumavam gostar da Torre de Tóquio, mas hoje parece que ninguém mais liga, especialmente depois que terminaram a antena Skytree em 2012, que é mais alta.
Afora a torre, Roppongi é basicamente bar e boate pra estrangeiro. Basicamente a cada 10 metros você é abordado por algum africano metido a gângster oferecendo libertinagens diversas. "E aí, não está interessado numas garotas? Tem cada uma com peitos do tamanho da minha cabeça".
Continua...
Migo, adoro ler sus historias, morro de rir!
ResponderExcluirMas tenho que te colocar um aviso: o anime que mais explora a torre de Tókio é Sakura Card Captors, com pelo menos uns 12 episodios diretamente relacionados.
Mas a lembrança do chefe Masaki foi sensacional!