sexta-feira, 21 de junho de 2013

Tapeçarias turcas

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Tapetes turcos à venda, perto de Éfeso.

Embora a fama no Brasil seja eminentemente dos tapetes persas (hoje Irã), na verdade foram os turcos os grandes responsáveis pela popularização da tapeçaria nos últimos séculos e pela sua difusão no Ocidente. Tapetes já existiam na Pérsia e na Babilônia antigas, mas somente a partir das Cruzadas (séc XI) é que eles começaram a ser trazidos à Europa, e de lá às Américas. A própria Índia, ao contrário do que se pode pensar, não tinha tradição de tapetes até a invasão dos muçulmanos por lá a partir também do século XI. Em particular, esses motivos de padrões geométricos e flores  que hoje se encontram em qualquer tapete ordinário de qualquer casa  se devem essencialmente à restrição do Islã a se retratar formas humanas ou de outros animais na arte. Voilà, eis a razão para o tapete da sua sala ser como é.

Devo confessar que apesar da malandragem do nosso guia Mehmet nos levando a essas lojas caras para gastarmos dinheiro onde ele tem conchavo, desta visita eu gostei. Fomos levados a uma espécie de ateliê  que na verdade era uma casa simples, à beira da estrada, com umas varandinhas onde as mulheres trabalhavam fiando tapetes e os homens faziam pose tentando vendê-los aos preços mais altos que pudessem.

Esses produtores turcos usam essencialmente lã, algodão e\ou seda como materiais. O processo de confecção manual pode durar anos, e aí você entende o porquê de preços tão exorbitantes que às alcançam milhares de euros. Eu só lamento que a minha impressão seja a de que pouco dessa renda chega ou é controlada pelas mulheres, que são quem dão o duro mesmo.
Artesã fiandeira. A arte exige mover, puxar, organizar e cortar com precisão os fios de várias cores,
de modo a formar aqueles padrões ali embaixo.

Embora não seja comum ver mulheres usando o véu nas grandes cidades da Turquia,  aqui no interior a história é diferente, e quase todas usam. Na verdade, o véu já é há muitos anos banido pela Constituição da Turquia, estado laico e secular que se organizou em 1923 após a queda do monárquico Império Turco Otomano ao final da Primeira Guerra Mundial. Em outras palavras, proclamou-se a república e desde então o uso do véu ficou proibido em cargos públicos, entre advogadas, jornalistas, parlamentares, e professores universitárias. É o oposto do Irã, onde o uso do véu é obrigatório.

Essa é uma briga imensa na Turquia ainda hoje. O governo atual, pró-véu, tentou inclusive emendar a Constituição para permiti-lo, mas sem sucesso. Nos anos 90 as universitárias usando véu eram até proibidas de entrar ou de assistirem aula. Embora isso não exista mais e as estudantes possam usar o véu, continua um clima de tensão e uma discussão constante sobre isso na Turquia de hoje.

Mas voltemos aos tapetes...
Mulher remove fios de seda daquele caldeirão, onde os casulos de bicho-da-seda
(larvas de uma espécie de mariposa) são fervidos.

Depois de vermos um pouco de como os tapetes são feitos, fomos levados a uma grande sala de demonstração com dezenas de tapetes enrolados. O grande "tchan" dos tapetes na cultura turca é que estes eram originalmente nômades, e assim podiam armar barraca em qualquer lugar, desenrolar o tapete no chão, e ter ali um ambiente confortável. Na hora de viajar, bastava enrolá-lo de novo e levantar acampamento. Mais tarde, quando os turcos se assentaram nesta região, os tapetes permaneceram como peças de arte, decoração e luxo nos palácios otomanos.

Sentamos nas beiradas da sala e ganhamos um chazinho pra assistir à exposição dos tapetes. Os turcos têm um hábito forte de tomar chá preto (ou, para os turistas, chá de maçã) nuns copinhos bonitinhos mas nada práticos  de vidro fino, sem nenhum lugar pra segurar, e bom de queimar a mão com o chá quente. (Às vezes acho até que o chá foi de propósito, pra derrubarmos em algum tapete e ter que comprar).
Nós sentados à beira da sala com o chazinho na mão assistindo à exibição de tapetes.
O copinho de chá típico na Turquia. Vem quente como o cacete. Bom de derrubar que é uma beleza.

O chá de maçã estava gostoso, embora seja bem pouco típico. Eles vendem para os turistas como se fosse algo tão turco quanto a figura do sultão, mas não é. Aqui o chá tradicional mesmo é o preto, e bem forte e sem açúcar.

Mas a beleza mesmo estava nos tapetes. Cada um mais bonitos que eu outro, e você fica com aquele olhar guloso e aquela cara de "Esse ia ficar bom lá na sala... aquele ali no meu quarto...".  O criado em silêncio ia atirando os tapetes no ar e desenrolando-os com maestria, inclusive virando-os de cima pra baixo como se fossem panquecas, mostrando como as duas faces diferentes podiam ser usadas. Enquanto isso, o outro, bem vestido, ia só caminhando pelos tapetes e gesticulando com aqueles movimentos e sorriso de apresentador de televisão, como se fosse funcionário do Silvio Santos ou alguma coisa assim.
Criado e "apresentador" de tapetes, numa exibição perto de Éfeso. 
Lindos tapetes turcos de algodão, lã e\ou seda. Os de seda tendem a ser menores, devido ao custo.
Belos tapetes turcos. Dava uma pena de pisar neles com os nossos sapatos...

Apesar de não ter comprado nada (fica pra quando eu ficar rico), valeu a visita. Os preços iam de algumas centenas até alguns milhares de euros. Depende essencialmente do material (seda sendo o mais caro) e do fato de serem feitos à mão. Eles, inclusive, nos ensinaram a meter os dedos e olhar a raiz dos fios do tapete pra ver se tem um nó, sinal de que foi feito à mão e não à máquina, pra quem ninguém compre gato por lebre. Em geral, os tapetes feitos à mão tem uma diversidade muito maior de padrões e de arte. E, diz a lenda, ficam cada vez mais bonitos com o tempo.
As mulheres trabalhadoras por detrás dos belos tapetes feitos à mão vendidos na Turquia.

4 comentários:

  1. Adorando o blog. O grande problema dos tapetes é que eles não são lá muito práticos e costumam juntar poeira que é uma beleza. Mas dá vontade de ter um.

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  2. Lendo seu relato, migo, pensei "Será que Aladim usou um feito a mão de seda para voar sobre o deserto?"
    Ai essa imaginação...

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  3. uaaaauu...maravilhosos os tapetes...pena mesmo que o trabalho das viandeiras seja tão pouco valorizado .. obrigada pelas informações históricas, Marco Polo das arábias...haha estou adorando...acho que vou à Turquia de malas vazias..haha

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  4. exactamente o que vi e o que senti, mas obrigada pela descrição.

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