sexta-feira, 26 de novembro de 2010

24h num trem indiano


A incrível jornada. Das praias do sul subindo de volta ao norte até Mumbai, a "São Paulo" da Índia - cosmopolita e coração econômico, mesmo sem ser a capital. Separando-me de Mumbai, 24h de trem. Trem povão, 4a classe (15 reais a passagem pra esse tempo todo de viagem, por aí você já tem uma idéia). Mas foi uma experiência inesquecível.

Saímos cedo. 5:30 da manhã eu já estava de pé e corrido, fazendo tudo caber dentro da mochila e me mandando pra a estação. O sol ainda mal raiava e eu já estava lá entrando no trem pra o que seria uma jornada de um dia inteiro e uma noite, chegando em Mumbai na manhã seguinte.

O trem indiano tem uma concentração grande de pessoas, como vocês podem imaginar. Em teoria, numa área de seus 1,5m x 3m vão 8 pessoas; na prática, logo na minha primeira hora de viagem contei 9 adultos e 5 crianças (sim, eu sou ótimo pra atrair a meninada). Pula pula, chororô, tudo isso. Nesse meio estava uma família em que o homem morou na Alemanha, então ficamos conversando. Ele dizia que, sempre que possível, botava os filhos pra viajar nessa classe pra eles terem uma melhor noção do país.

O trem povão é também pinga-pinga, como você pode imaginar. Toda hora pára e entra gente. Além de passageiros, entram os vendedores ambulantes, que são a verdadeira alma do trem povão. Nessa viagem provei: samosa (uma fritura com batata e especiarias dentro), chai, doce de manga, bolinho de arroz com molho de côco, pão chato, goiaba com sal e pimenta, e outras coisas que eu já esqueci.

(Um adendo sobre as frituras aqui. Uma vez perguntei a um entrevistado meu se eles não usavam resíduos de óleo frito, de restaurantes, pra fabricar biodiesel, como no Brasil. Ele disse que não porque mesmo esses óleos de mais uma semana ainda tem quem compre para fritar ainda mais. Então já viu).

Normalmente eu não entro muito nessas frituras de beira de rua, e também essa história de goiaba com pimenta não me apeteceu muito, mas acabei me juntando a um grupo de indianas pra jogar baralho, e aí rolou aquela pressão, hehe. O mais interessante foi ver a cara dos mais velhos olhando eu e um bando de rabos de saia (ou de sari) dando risada e jogando. Na Índia, normalmente os grupos de jovens são unissex: você vê aquele bando de rapazes juntos parecendo o clube do Bolinha, posando de gostosões (os indianos adoram posar e andar parecendo bad boy, igual o povo que vai pra a exposição agropecuária lá de Feira dar em cima das domésticas). Ou então é aquele bando de moças dando risada e confabulando, sem nenhum rapaz no meio. Eu já estava de saco cheio de ficar conversando só com homem (até porque os caras indianos às vezes tem uma conversa beeesta...), então puxei conversa com as moçoilas e acabamos jogando. Foi divertido e foi boa companhia pra ajudar a passar o tempo.

Pra ter uma noção melhor do ambiente do trem, nada melhor do que vocês mesmos verem, então fiz um curta. (É só copiar o link e colar no navegador. Ponham o brilho alto porque está meio escuro - era de noite).

http://www.youtube.com/watch?v=a7x6T6tVd9Y

Duas horas "pegam" no trem povão. A gandaia dentro do trem, o entra e sai de passageiros e de vendedores você acostuma (se não acostumar, você surta), e num grupo fica até divertido. O negócio pega é na hora do banheiro e na hora de dormir. Como vocês viram, o banheiro estava fechado na hora do vídeo mas eu tirei uma foto pra vocês verem.

Esse é o banheiro típico indiano. É, sem vaso mesmo. Tradicionalmente  indiano não usa vaso, faz em pé ou de cócoras. Hoje em dia é que vaso está ficando comum nas casas, mas mesmo assim banheiro público é quase sempre sem. Ou quando tem, vem escrito "Western Toilet" na porta, hehe. No trem tem um por vagão (+ dois em estilo indiano), mas depois da segunda hora já tá a fedentina e a molhação no chão.

A segunda hora complicada é a de dormir. A classe povão vai (i) sempre (i) com gente a mais. O negócio é que aqui eles usam um sistema de reserva em que, se alguém cancelar, o lugar é seu. Como você nunca sabe se vão cancelar ou não até a hora H, você entra. Aí frequentemente dúzias de pessoas vão no chão, dividindo assento, no motor... tem de tudo. No meu caso, primeiro descobri que o lugar de deitar não me cabia, tive que ir encolhido, e dividindo o espaço com uma senhora idosa gorda que estava sem lugar e um menino (também gordo) que estava espirrando e com a garganta ruim. Já imaginou aí que climão bamba pra dormir? Agora, parando pra analisar, pense aí que muitos daqueles outros - do menino gordo gripado e sem assento até o povo dormindo no chão - estavam em situação muito pior do que eu, e se bobear eles passam por isso todo mês.

Você, é claro, não dorme - você no máximo cochila por 2h, aí acorda, tenta se revirar e vê que não dá, aí tenta dormir assim mesmo, acorda de novo...

Mas entre mortos e feridos salvaram-se todos (eu acho). De manhãzinha cedo estávamos chegando a Mumbai, para uma bela manhã de chuva.

Mumbai lembra um pouco Nova York, com táxis amarelo-e-preto por toda parte (tuk-tuks são vetados na cidade) e a baía ali ao lado dos prédios.
Vista da baía de Mumbai numa manhã chuvosa de domingo.

Eu tinha o dia pra visitar a cidade. Depois o sol abriu e deu pra andar legal pelo centro - Mumbai é bem mais organizada do que Nova Délhi. Deixo vocês com algumas fotos do meu passeio, inclusive do Taj Hotel onde teve os atentados terroristas de 2008.

De Mumbai outro trem me esperava no fim do dia para Agra, pra finalmente ver o Taj Mahal  tema do próximo post.
Indianos jogando críquete no campo no domingo de manhã. Ao fundo, prédios do Século XIX da época do domínio britânico na Índia. Mumbai (antiga Bombaim)
Área central de Mumbai, quieta num domingo de manhã. Ali os modelos dos táxis, quase todos antigos. Mas já é melhor do que os tuk-tuks, vetados na cidade.
Mumbai
Taj Mahal Palace & Tower, máximo hotel de luxo em Mumbai, vítima de ataques terroristas em novembro de 2008.
The Gateway of India, erigido em homenagem aos monarcas ingleses quando visitaram a Índia em 1911.
Rua do bairro da Colaba, em Mumbai.
Loja de perfumes e óleos em Mumbai.

2 comentários:

  1. Dá pra chegar em Mumbai sem ser nesse trem? Até me animei pra conhecê-la. Menino.. fiquei curiosíssima com essa imagem dos óleos e perfumes hehehehe Beijos!

    ResponderExcluir
  2. Oi, Marion! Pena que sua passagem pela minha cidade tenha sido tao curtinha!!!Mas, fico feliz que tenha gostado! Eu gosto muito de Mumbai, apesar de ela ser a cidade mais caotica na qual ja vivi ate hoje. Um abraco!

    ResponderExcluir