terça-feira, 31 de maio de 2011

Yogyakarta: Uma jornada ao centro da Ilha de Java



Esse aí na foto é o singelo vulcão Merapi. Parece até alguma imagem tirada de Jaspion. Não, eu não tirei a foto pessoalmente. Ele explodiu da última vez em dezembro passado (2010), mas agora está quietinho  até quando, não se sabe. As pessoas de Java Central já se acostumaram a viver com um vulcão por perto.

Mas o centro de Java reserva mais do que um vulcão temperamental. Na verdade, apesar de Jacarta (no oeste da ilha) ser a capital, as belezas culturais e as tradições javanesas estão em sua maior parte no centro da ilha. Não sei qual é a noção de vocês sobre o tamanho de Java, mas a ilha tem basicamente a forma de um retângulo com apr. 100km de norte a sul e 1000km de leste a oeste. É bastante chão. Sendo assim, levei 10h pra chegar daqui de Bogor até Yogyakarta, considerada o coração da cultura javanesa  lá pertinho do Merapi.

A viagem de trem foi um martírio, mas valeu a pena. Basicamente, eu e a minha amiga-intérprete Jubi deixamos pra comprar os tickets de trem na última hora, e acabou que a única categoria disponível era a classe "povão". E, ah, viajando em pé, pois os assentos estavam esgotados. Nessa categoria, mesmo depois de lotar eles continuam vendendo passagem, e você que se vire lá sem assento.

Primeiro tentei dormir sentado no chão do corredor, com as costas na lateral de um dos assentos e as pernas estiradas cortando o corredor. Não prestou. Quando passou o primeiro baleiro, parecia que eu estava pagando um boquete. Decidi me espichar de vez, com as costas no chão em cima de um jornal. Em tempo lotou de gente no corredor, e poucas horas dali já estava eu quase dormindo "de conchinha" com uma tia. E os vendedores passando a passos de garça pra não pisar no povo. Foi memorável. Em alguma religião deve ser ritual de humildade você ter vendedores sujos, pobres e de pés descalços passando sobre você. Dez, vinte... Confesso, não me pisaram nenhuma vez, mas os gritos de venda durante a noite inteira davam nos nervos. Você lutando pra cair no sono (obs: as luzes vão acesas a noite inteira) e o indivíduo prum lado e pro outro gritando kópiiiiiiiiii (café), tahuuuuuuu (tofu), mie ayaaaaaam (macarrão com galinha). É nessas horas que faltava uma versão indonésia de Iara, a minha vizinha lá de Feira de Santana, pra anunciar: "Moço, ninguém aqui quer café não! O senhor não tá vendo que o povo quer é dormir?!". Mas aí você pára pra sacar: Putz, o cara tá aqui vendendo café à meia-noite pra tentar arranjar um trocado de nada e sobreviver? E eu reclamando porque às vezes estou no batente até depois das 6...


O trem e o povo já de manhãzinha, alguns ainda espichados no chão. 

Chegando às 6 da manhã em Yogyakarta, estávamos mortos. (Quem conseguiu dormir? No máximo cochiladas de meia hora). Iqbal, um amigo de Jubi, foi nos pegar. Dali fomos à casa dele, deixamos as coisas, e fomos ver a cidade. Como eu disse, Yogyakarta é a capital cultural de Java, e isso inclui os famosos batik, motivos das roupas javanesas e que aqui todo mundo usa.
Batik é parte da tradição javanesa. Trata-se de motivos florais ou de padrões de desenho diversos, como esse da camisa do homem na foto. Quase todo mundo em Java se veste diariamente (ou quase que diariamente) com roupas assim. 
O mais interessante dos batik é que, tradicionalmente, eles são desenhados à mão, como faz essa senhora aí abaixo.
O batik tradicionalmente se faz com uma pinça e tinta, e vai sendo desenhado à mão. Hoje em dia, claro, há indústria que faz isso no computador, mas os artesanais são muito mais valorizados - e, claro, são bem mais caros.
Yogyakarta é o paraíso dos batik, e isso vale pra qualquer coisa - toalha de mesa, etc. Yogyakarta é também centro da dança e música javanesa. Tradicionalmente, é um canto que lembra um pouco aqueles cantos chineses ou japoneses (pra quem já viu em filme) e que parecem um lamento.
Esse vô da foto tocava o instrumento de corda e cantava. Parecia até qualidade de studio. Show de bola (ou melhor, show de corda e de voz). 
Pra quem notou ali na foto acima, ao lado do vô musical há um quadro. Ali é ninguém menos que o sultão. É, Yogyakarta tem um sultão. Antes de a Indonésia ser independente (guerra durante 1945-1949), ela era colônia da Holanda; antes de ser colônia da Holanda, havia muitos reinos e sultanatos de diferentes tradições pelas várias ilhas que formam o país (daí haver ainda vários conflitos étnicos na Indonésia). Vários lugares ainda mantêm as famílias dos reis e sultões. Embora esses não tenham mais o poder político, ainda são muito prestigiados  e normalmente são ricos e tem certo poder de manobra social. Esse é o caso em Yogyakarta.

Se a gente voltar um pouco mais no tempo, antes de essa região de converter ao Islã (o que ocorreu ao longo dos anos de 1200-1600), aqui havia reinos budistas e hinduístas  que são religiões muito mais antigas. São dessa época anterior ao Islã os monumentos mais impressionantes que permanecem no centro de Java. Fui visitar alguns deles.

O primeiro deles é Prambanan, um templo hindu do século IX, dedicado às três principais divindades hindus: Vishnu, Shiva e Brahma. (Em algumas visões, é como a santíssima trindade no Cristianismo: três faces de uma entidade só. Mas essa é uma discussão teológica mais longa...). O templo principal tem 47m de altura, e os interiores têm estátuas dos deuses com seus 3m. Entrar neles é uma sensação bem Indiana Jones.
Templo hindu de Prambanan, em Java Central. Do século IX.
Adentrando um dos templos de Prambanan, em Java Central.

Por fim, no dia seguinte, fomos visitar um dos outros pontos marcantes da região, desta vez um templo budista, Borobudur. Borobudur é do século VIII, portanto mais antigo que Prambanan, e tem um conceito bem interessante: são nove plataformas formando uma espécie de pirâmide, em cada uma delas há ilustrações esculpidas mostrando aspectos da vida de Buda e, em geral, da vida humana. A idéia é que, de baixo pra cima, as coisas vão se "elevando". Enquanto que na base são ilustrações de cenas mais carnais, mais pra cima as ilustrações vão se espiritualizando e no topo você tem o nirvana.
Pra entrar na área do templo, é preciso usar o sarong, uma roupa típica do sudeste asiático.



Como eu disse, a viagem de trem valeu a pena. Mesmo assim, como na segunda-feira eu tinha compromissos e não podia me dar ao luxo de mais uma noite sem dormir, voltamos de avião. Ainda demos boas voltas pela cidade, tomei muito suco de graviola, e comprei feito mulher de marido rico. Não sei onde é que vai caber tudo, já que - ao contrário da Índia - aqui eu estou com um limite de bagagem bem mais apertado. Mas não quero nem saber, largo pra trás coisas ordinárias (tipo toalha de banho) pra fazer espaço. Vou descobrir logo logo se as minhas mochilas cabem ou não cabem tudo. Amanhã voo pra Bali, que será a etapa dessa estadia na Indonésia. Deixo vocês com algumas fotos de Java Central.
Amanhecer sobre os campos de arroz em Java Central. Tirada do trem.
O Merapi, mais quietinho. De várias partes da cidade dá pra avistá-lo no horizonte. Esta foto não fui eu que tirei, mas dá uma idéia.
Em Prambanan. Jubi é a de véu cinza.

Vista do alto de Borobudur.
Prato tradicional de Yogyakarta: Jaca verde cozida no leite de côco com pimentas, ao lado de acompanhamentos. Uma delícia, na verdade! 

Post final com a conclusão desta viagem à Indonésia: Mairon em Bali: Praias, templos, e o famoso Café Luwak.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

No Coração da Sumatra

Eram 6:00h da manhã de domingo quando eu ainda me revirava na cama. Acordei ao som de música  talvez o último tipo de música que eu esperaria ouvir num país muçulmano: canto de música evangélica. Oxente, o que é isso? Pensei que ainda estiva sonhando. O som vinha alto e animado lá do térreo. Eu ainda estava no hotel. Era dia de partir pra o interiorzão brabo e conversar com agricultores.

6:20 religiosamente me bateu à porta o café da manhã. Ao contrário da vez anterior, desta ele não me acordou. Só que ficou meio desconcertado de me ver sem camisa (eles aqui são meio conservadores na vestimenta, mas depois eu falo mais disso). Comi o engana-estômago que eles dão e me arrumei pra descer. Chegando lá embaixo, a maior fuzarca com vendinhas de santinhos de Jesus, quadro, e a cantoria mais poderosa do que nunca no salão de convenções do Hotel. Vixe que Edir Macedo baixou aqui. Pois é, a minoria cristã da Indonésia faz a maior festa aos domingos, enquanto que os muçulmanos fazem festa na sexta-feira. (Outro dia, por exemplo, eu acordei com o som empolgado da ginástica feminina nos arredores do meu alojamento. Com uma senhora empolgada no microfone e as mamães, de véu, esticando as pernas igual àqueles projetos "Verão saúde" de prefeitura). Em outras partes da Indonésia há maiorias católicas, mas na Sumatra a maioria dos cristãos é protestante.

Ao som da música evangélica, fui tomar café, me encontrar com Jubi, minha amiga-intérprete, e fazer o check-out do hotel. Cedo veio o carro nos pegar pra levar à primeira vila que visitaríamos. A estrada até boa, caí na besteira de dizer. Depois parecia a lua. Aquele barro vermelho maravilhoso e cheio de buracos. "São os caminhões das minas de carvão que passam por aqui e fazem isso", me disse o rapaz que dirigia.
Depois que chegamos à área mais de roça mesmo, a paisagem ficou assim.
Me reuni com vários agricultores na primeira vila. Chegamos à casa do Chefe da Vila, com quem tínhamos contato, e lá ele juntou um povão. Só homem, e como (quase) todo homem na Indonésia fuma, estávamos conversando numa nuvem de fumaça. Pelo menos afastava os mosquitos. A dona da casa nos trouxe banana frita, outros quitutes caseiros e  demonstrando certa sofisticação  donuts. (Pra quem não está familiarizado, são aquelas roscas de pão branco açucaradas que se vêem muito em filme americano). Veio também o café, carregado de açúcar. Na Sumatra eles põem açúcar é com a colher de sopa. Não estou brincando, vi muita gente fazer isso, principalmente os pobres. A minha comunicação com eles era basicamente na base de gestos e sorriso. Jubi deu conta de toda a conversa. Pra eles eu era o "Mister", como me chamavam. E quando descobriram meu sobrenome, Lima, que na língua indonésia quer dizer 5, aí pronto, foi a diversão e eu virei "Mister 5". (Daí pra Mairon 5 e pra Maroon 5 é um pulo).

Ficamos lá para a noite e, apesar do lugar remoto, tinha até televisão. O menino da casa, Bima, era o que mais assistia (talvez até demais). Nessa de quererem dar à criança a tecnologia que não tiveram, correm o risco de passar um pouco do ponto, mas enfim.
Com Bima na vila de Muara Jambi, Sumatra.
As casas dos agricultores quase sempre têm essas varandinhas, e você tira o sapato ao entrar. Do lado de dentro, contudo, não há mesas. As refeições são feitas sentado no chão. Foi o mesmo quando dali fomos a Muaro Bungo, uma outra vila mais distante. Pra essa eram 7 horas de viagem num micro-ônibus, o lugar não pegava nem sinal de celular. A eletricidade era a gerador e só por algumas horas.
Tarde na vila de Muaro Bungo, Sumatra. Só faltava o mar. Com tantos coqueiros, você tem a impressão de que ele vai estar logo ali.
Pequeno rio em Muaro Bungo, Sumatra. Nesse local estão com um projeto de conservação e utilização dessa corrente pra micro-hidrelétricas, pra que não precisem mais dos geradores a die$el.
Arroz deixado pra secar ao sol em Muaro Bungo, Sumatra.

A terceira vila a visitar na Sumatra foi Tanjung Jabung (legais os nomes, né?). Aí é onde estavam tendo conflitos entre algumas comunidades e umas madeireiras, por disputas de terras. Tá pensando que é só no Brasil? Mas por sorte não me meti nas áreas mais "quentes". Basicamente conversamos com alguns funcionários do governo na região. Meu contato com "madeira" foi mais  pra usar as palavras de um amigo meu  escatológico. No lugar onde almoçamos me deparei com um "banheiro" igual àquele do Quem quer ser um milionário?, pra quem viu o filme. Basicamente, a localidade era essa aí das fotos abaixo, na beira de um rio. Eu perguntei ao cara onde era o banheiro e ele me apontou pra ir pra o fundo do restaurante. Eu já não sabia mais pra onde caminhar, sem encontrar o tal do banheiro, até que ele me apontou o dito cujo. Apetece?
A entrada do restaurante.
O restaurante, visto do fundão.
O banheiro do restaurante. Esse aí da cortininha azul.
Entre mortos e feridos, salvaram-se todos. (Por sorte foi n.1, o uso do banheiro). Após esse tour, voltamos a Java e retomei as pesquisas. Voltei ao alojamento onde estava, e agora estou já na reta final da minha estadia na Indonésia. Acumulei algumas coisas a comentar, pois a pesquisa estava puxada, mas agora sobrou um pouco mais de tempo e eu devo tirar o atraso e viajar também.

Pra começar, hoje à noite vou pegar o trem para Yogyakarta, a capital cultural de Java. Fica a 10 horas daqui de Bogor, então pegaremos o trem noturno pra chegar amanhã de manhã. Passo o fim de semana e volto. Por sinal, essa viagem de trem de hoje provavelmente será memorável: como deixamos pra comprar na última hora, só sobrou a classe povão. Já deram umas risadas da minha cara aqui no escritório, na sala de Pá Harry. E Jubi (que vai junto) está desesperada. Vamos ver o que nos espera. Mando notícias quando voltar.

Continua em: Uma Jornada ao Centro da Ilha de Java
Templo de Borobudur, em Java Central, perto de Yogyakarta.

sábado, 14 de maio de 2011

Direto de Jambi, Sumatra

Meu paradeiro atual. Jambi fica mais ou menos ali onde está o ponto branco mesmo. Interiorzão da ilha.

Tarde de quinta-feira. Jambi, interior da Sumatra. De um lado, o muezim chama "Allaaaah"  igual em O Clone  e lembra aos fiéis a quarta oração do dia. Do outro, alto som de Lady Gaga na festa de casamento rolando no salão do hotel. Mairon, sentado no lobby, dá aquela risada silenciosa com o choque de culturas. (Não, a música não era "Bad Romance").

Os muçulmanos têm de rezar 5 vezes ao dia, e com hora mais ou menos marcada: (1) Ao levantar do sol, (2) ao meio-dia, (3) no meio da tarde, (4) ao pôr do sol, e (5) à noite antes de ir dormir. Há variações quanto ao horário, dependendo do país e da estação do ano. Aqui na Indonésia, como o clima é equatorial e a duração dos dias não varia muito, eles seguem esse esquema aí. Altas vezes quando estou com Jubi, minha amiga-intérprete, num shopping ou algo assim, rola um "Peraê que agora eu tenho que rezar". Todos os prédios públicos aqui na Indonésia tem mushollas, que são salinhas de oração com tapetes etc. Em casa ou no trabalho, normalmente todo mundo tem o seu tapete que estende no chão em direção a Meca (assisto às rezas de Pá Harry, meu colega de escritório, todos os dias lá em Bogor). Mas é uma oração silenciosa, de uns 10-15 min. Ajoelha, encosta a testa no chão, e balbucia as orações em voz baixinha.

O que eu não previ foi que essas orações iriam interferir na minha rotina. Não tente marcar nada pra sexta-feira final da manhã, pois é o dia das orações principais para os homens na mesquita. Então às sextas de manhã eu só marco entrevista com mulher. Outra coisa é o horário do café da manhã. Estávamos eu e Jubi procurando hotel, ela traduzindo o que a recepcionista ia dizendo:

 Mairon, a recepcionista está dizendo que o quarto tem televisão e ar condicionado. E eles servem o café da manhã no quarto, incluso no preço.
 Parece legal.
 Entre 5:30 e 6:00 eles batem na sua porta pra entregar.
 (!!!!) O quê?! Não, diga a ela que minha reza é flexível no horário, e que ela pode pular a porta do meu quarto.
- Kkkkkkk. Mas e aí, vamos ficar com esse então?
 Pera, quero saber mais uma coisa. Pergunta a ela se tem chuveiro.
*Jubi pergunta*
 Ela disse que não. Só no preço "Suíte" é que tem uma banheira, mas também sem chuveiro.

Fomos ver o quarto, um cheiro de mofo, e o banheiro dava tristeza. Fomos procurar outro hotel.

Este aqui  onde finalmente nos instalamos  não é mau. Um pouco mais caro, mas aqui nada é caro demais. Tem chuveiro e, de quebra, internet. E aqui eles só me acordam às 6:20 pra o café na porta (um engana-estômago). Me divirto horrores imaginando como cada um de vocês reagiria, haha. 

O hotel também é animado. Dois casamentos rolando aqui hoje. Não vi cerimônia nenhuma, só a festa. Mas esses são sino-indonésions (minoria de ancestralidade chinesa e que, em geral, não é muçulmana). Portanto, o único ritual que vi foi o karokê com a meninada desafinando. Dois carros enfeitados esperam na porta, onde também há painéis com os nomes dos casados escritos em flores artificiais produzidos pela "Honesty Florist".

Falando nisso, pouca gente sabe, mas a Sumatra abriga a maior flor do mundo  a Rafflesia arnoldii (não, não é referência ao Schwarzenegger), de até 11kg e 1m de diâmetro. Se fosse na Holanda, isso teria todo um empreendimento, além de empresas floristas com flores tropicais, etc. Mas aproveitar recursos da região, incentivar produtores locais e tal, isso não é comum aqui. Hoje procurei sorvete pra aplacar o calor e os únicos sabores que você encontra são: chocolate, baunilha, morango e mirtilho (mais conhecido como blueberry nos países de língua inglesa). Provavelmente a grande maioria dos indonésios nunca viu e nunca nem nunca vai ver um mirtilho. Enquanto isso, as ruas estão cheias de vendedores pobres com graviolas, goiabas, frutas-dragão e outras delícias dos trópicos asiáticos... todos excluídos, frutas e vendedores.
A Rafflesia arnoldii, maior flor do mundo. Nativa da Sumatra e do Borneo. Pensei em ir ver, mas ela só floresce na época de chuvas, depois de novembro.
Lichia, fruta mais ou menos do tamanho de um limão. Meio acri-doce. Dá pra encontrar importada no Brasil, pelo menos no sudeste.
A fruta-dragão é maior, do tamanho de uma manga grande. Difícil descrever o sabor, mas é boa. Esse interior é meio mole e suculento, então as pessoas tiram com a colher. Nunca vi no Brasil.
O "Cisne Negro" das frutas aqui é uma que parece feita de enxofre, dúrian, de longe a mais fedida que já vi. Por dentro parece uma jaca, só que o gosto é completamente diferente (horrível, na minha opinião). Mas dizem que é afrodisíaco. Aqui chamam dúrian de "O Rei das Frutas".
Pra vocês terem uma idéia de o quanto essa fruta fede, fotografei o aviso aqui do hotel junto das lixeiras.

A Sumatra é menos desenvolvida que Java, e Jambi tem aquele ar de cidade do interior movida a agronegócio. Não tem muito o que ver ou fazer aqui, então as saídas são mais pra comer algo mesmo. Fui parar em lugares muito glamurosos nestes últimos dias: daqueles com a toalha plástica transparente que gruda no seu ante-braço enquanto com a outra mão você segura o garfo e tenta espantar as moscas. Ou daquelas que a mesa é de alumínio batido a prego na madeira. Essa foi de uma banquinha onde Jubi e eu estávamos comendo bolinhos fritos (de arroz e de tofu, servidos com molho de soja e de pimenta) enquanto eu assistia ao cara enxugar o suor do pescoço com o pano de prato. Que maravilha!
Jambi, Sumatra
Comendo tofu frito na barraquinha de rua. Mesa de madeira com folha de alumínio pregada em cima.
Esqueça a floresta equatorial aqui  nesta região ela já quase toda deu lugar a plantações de borracha, eucalipto e palmeira oleaginosa (dendê), que os ruralistas aí no Brasil estão doidos pra espalhar na Amazônia e chamar monocultura de "reflorestamento", engana trouxa. Minha pesquisa tem olhado um pouco essas questões, então tenho passado os dias basicamente visitando gente do governo, ONGs, entre outros. Nosso principal contato aqui é Pá Aswanti, um sujeito meio doido e que lembra o Coringa só que de cavanhaque. Ele é estranho, mas tenho que admitir que está sendo prestativo.

Ontem ele estava me explicando como arroz tem colesterol enquanto eu suava debaixo do ventilador de teto do lugar onde a gente foi almoçar. Os Sumatrenses tem um método muito particular de servir o almoço: eles trazem todos os pratos à sua mesa e você escolhe pegar do que quiser. Há normalmente uns 12 pratinhos com porções das diferentes comidas, incluindo salgadinho de pele de boi frita, cabeça de peixe, e jaca verde cozida no molho. Você vai tirando com a sua própria colher ou com a mão mesmo. Boa parte das pessoas aqui come de mão, então eles lhe trazem uma tigelinha d´água pra você limpar as pontas dos dedos. O que você não comer ou que sobrar, volta pra a panela principal pra ser servido ao próximo cliente (legal, né?). Ao final vem o garçom com o bloquinho e faz a contabilidade com base no que você comeu ou deixou de comer. 

Mas isso aqui ainda não é zona rural meeeeesmo. Este fim de semana, aí sim, será hora de me embrenhar no brejo. Irei ao vilarejo de Muara Jambi pra passar a noite lá e também conversar com agricultores. Estou de saída daqui a pouco. Ontem deu um toró acaba-mundo e a estrada deve estar uma beleza. Depois desta serão Muara Bungo e Tanjung Jabung na semana que vem. Tenho certeza de que as histórias virão. 

Continua em: No Coração da Sumatra.

domingo, 8 de maio de 2011

Umas saídas em Bogor

Fiquei devendo. Foto do belo interior das angkot, as vans de transporte público aqui da Indonésia. O menino ali sentado na porta é cantor. Estava entoando uma "bela" cantiga na esperança de conseguir um trocado. Aqui na Indonésia pelo menos metade dos pedintes chegam fazendo uma serenata pra você em vez de pedindo dinheiro logo de cara. Verdade seja dita, alguns até tocam/cantam bem. Já imaginaram a moda pegar no Brasil?

Enquanto não viajo pra Papua, Bali, Komodo e esses lugares mais exóticos da Indonésia, vou dando minhas voltas aqui em Bogor no tempo livre. Não há grandes templos ou ruínas históricas, como havia em abundância lá na Índia. O turismo aqui é mais pra o lado de praia e de parques naturais. Há templos em algumas regiões, já que antes de ser islâmica a Indonésia era em grande parte hindu.


Em Bogor, a principal atração é um super jardim botânico, onde eu fui participar de um dia de comemoração ao Dia da Terra, fim de semana passado. Conheci um pessoal aqui que me convidou. Achei que ia me distrair e confirmei mó entusiasmado, "Claro, vou estar lá!", sem nem saber o que era. Aí depois recebo o SMS: "Ótimo que você topou participar! Amanhã de manhã 7:30 no jardim botânico, faremos recolhimento do lixo". Poutz. Ééé, tá pensando que trabalho ambiental é moleza?

Chegando lá havia uma centena de estudantes uniformizados, crianças e adolescentes, todos preparados pra o mutirão de cata de lixo. A meninada me viu, aí pronto, tem sempre o espalhafatoso que grita: "Ó O ESTRANGEIRO!!!" Aqui "estrangeiro" é a mesma palavra que eles usam pra "loiro". Loiríssimo eu, né? É herança do passado, já que a Indonésia era colônia holandesa até 1945, então esses são os estrangeiros que eles mais conhecem.

O próximo passo é o jogo de tentar adivinhar de onde eu sou. Nunca acertam. Às vezes eu passo por indonésio, mas não é sempre que funciona. Normalmente, quando o fulano olha direito, percebe que eu não sou daqui.

- Austrália!
- Holanda! 
A meninada sempre chuta os países que conhecem mais. Aí começa a baixaria:

- William! (Tá certo, eu sou mesmo a cara do príncipe William)
- Justin Bieber! (...)

No final eu digo que sou do Brasil aí eles ficam com aquela cara de "Nossa, nunca tinha visto". Botamos a molecada pra catar o lixo.
Praticantes de artes marciais que estavam treinando no parque.
Lixo que não acabava mais, nos córregos que passam pelo jardim botânico.
Jardim botânico em Bogor, Indonésia

Ontem, pra contrastar, fui no shopping ver como é que se comporta a classe média da Indonésia. Aqui é engraçado, porque nesses "ambientes pra rico" quase tudo é sinalizado em inglês. É considerado chique. Além disso, eles eles acham sofisticado comer pão. Pobre come é arroz. Então há imensas lojas super populares onde você compra pão fatiado, roscas, donuts, e essa coisa toda que se acha em qualquer padaria ocidental. Aqui é o Ó do borogodó.

O cinema também me reservava algumas coisas interessantes, hehe. Super sofisticado, o pessoal todo fino, e os adolescentes de classe média rodando pra lá e pra cá, como no Brasil. Só que aqui, no fim de semana, eles vêm com um menu pra você - você já sentado lá na sala do filme. Pipoca é bobagem, aqui você pode pedir sanduíche, batata frita e até carne assada pra você enquanto assiste ao filme. E dizem que brasileiro é que é farofeiro. Na hora de começar o filme, depois das propagandas, de repente a tela trava. Aí no cantinho da tela sobe a janelinha do Avira, o antivirus grátis. Foi surreal.

Bom, esta terça-feira estou indo para a Sumatra, onde devo passar 10 dias. Então mais histórias pra partilhar com vocês.

Continua em: Direto de Jambi, Sumatra
A sofisticação em falar inglês e comer pão.
Enquanto isso, o povão come o que a rua oferece: tofu frito, banana frita, arroz frito, mingau salgado de arroz  (bubur), e mais. As frituras são gostosas, o bubur nem tanto. Só não presta quando o vento bate errado e aquela fumaça preta de fritura  e óleo queimado vem em direção a você...