domingo, 14 de agosto de 2011

Mairon na Transilvânia

Veja uma versão de melhor visualização deste post no novo site, em:
A Transilvânia: Sinaia, Sighisoara, e Brasov (e, é claro, o Drácula)

Cá eu vim parar, na terra do Conde Drácula. Aqui viveu o príncipe Vlad o impalador, que inspirou a lenda do vampiro. Mas ao contrário do que você pensa, a Transilvânia é um lugar lindo. Esqueça a escuridão dos filmes de terror: na Transilvânia o que você tem são florestas sobre as colinas e belas cidades medievais. Ah! Os castelos estão lá, sim, e são um primor. Seu Vlad e aqueles que o sucederam tinham bom gosto!

Quem vem à Romênia tem de vir à Transilvânia. A região fica no centro da Romênia, envolta pelos Cárpatos, uma cadeia de montanhas mais ou menos em forma de U. No meio está a Transilvânia - nome dado pelos romanos (trans silvania, "para além da floresta"). Eu cheguei para uma estadia curta, mas já no caminho me impressionei de - finalmente - ver florestas na Europa. Achei que já tinham acabado. Mas que nada, na Romênia ainda tem até ursos que de noite vêm à cidade atrás de lata de lixo.


Castelo de Peles (pronuncia-se Pelésh), em Sinaia, na Transilvânia. Esse é do Século XIX.
Nos jardins do Castelo de Peles.
Do interior eu não pude tirar fotos, mas é também fascinante. (Agora, convenhamos, imagine esse jardim com essas estátuas aí à noite, brumas, ventos uivantes, e você tem o cenário perfeito de um filme de suspense). Acho que não foi à toa que Bram Stoker, o autor de Drácula, escolheu a Transilvânia como cenário da sua história. Ele se baseou no príncipe do século XV Vlad Dracula, o impalador. Só que a história real é mais interessante:

No século XV a Europa oriental estava resistindo ao avanço dos turcos otomanos, que derrubaram Constantinopla em 1453 e continuaram invadindo Europa adentro... Hungria, Romênia, e até Viena na Áustria eles atacaram. Foi então que criou-se uma ordem de cavalaria monástica, tal como os Cavaleiros Templários: a Ordem do Dragão, cujo objetivo era "destruir o perfídio inimigo" (os turcos) sob inspiração de São Jorge, que esses cavaleiros tomaram como patrono devido à lenda. Um dos mais notórios cavaleiros dessa ordem era quem? Vlad II, da Transilvânia, que ficou conhecido como Vlad, o dragão, ou "Vlad Dracul", em romeno. Esse era pai do impalador. Seu filho ficou sendo Vlad III, "o filho do dragão", Vlad Draculea. O mancebo nasceu em Sighisoara (lê-se Si-gui-shoára), no coração da Transilvânia, essa cidadezinha aí abaixo e que eu fui visitar.
Vista de Sighisoara do alto de uma das torres. Cidade dos idos de 1100 e muito bem preservada.
Ruas da parte antiga de Sighisoara.
A casa onde nasceu o dito-cujo, essa amarela. Hoje um bar e restaurante.
Ruas de Sighisoara à noite. Belos cafés de varanda, bons pra um pedaço de bolo, um cálice de vinho ou um copo de socata, uma bebida romena típica  feita com a essência de uma flor.

A Romênia, é claro, se aproveita das histórias do vampiro para extrair dinheiro de turista, vender camisetas e lembrancinhas com a cara do Drácula. Dá até pra comprar dentes de plástico pela rua, igual àqueles que vendiam no Brasil na época de Vamp (a novela). Um dos maiores pega-turista é o Castelo de Bran, perto da cidade de Brasov (lê-se Brashóv), que dizem ser "o castelo do drácula". Mentira, o cara nunca morou lá. Ele (o impalador original) na verdade ficava de um lado pro outro, pois a região estava em guerra e ele participando. Diz-se, inclusive, que a fama dele de cruel e sanguinário se deve aos alemães que na época não o ajudaram contra os turcos e que, para se justificar, começaram a divulgar histórias de como ele era sanguinolento e não merecia ser ajudado. Vê aí como a política determina a narrativa de como a História é contada? As histórias se espalharam pelo Ocidente, mas na Romênia ele é tido como um bom governante e bom defensor da região contra os turcos (embora estes mais tarde tenham invadido mesmo assim). Dito isso, ele era de fato severo na punição com criminosos. Além de impalar os inimigos em estacas de madeira, diz-se, por exemplo, que os ladrões ele amarrava, depelava os pés, punha sal, e mandava cabras pra lamber o sal. Urgh!

Não fui ao falso castelo do cara, mas fui a Brasov. Se você viesse aí nos anos 50, teria ido a "Cidade Stálin", pois os comunistas resolveram mudar o nome. Legal, né? (Olha como a história desse mundo já teve líder doido). Depois os romenos trouxeram o nome original de volta. Cidade bonita, foi minha parada final na Transilvânia. 
Brasov. Naquele letreiro lá em cima à là Hollywood, ali costumava estar escrito "Stálin".
Centro de Brasov.
Centro de Brasov.
A "Igreja Negra" de Brasov, que pegou fogo mas não desmoronou. Desde então as pedras ficaram escurecidas pelas chamas e a igreja ganhou o nome.
Brasov, Transilvânia, Romênia.
De lá, uma volta rápida a Bucareste e, no dia seguinte, viagem ao litoral da Romênia, no Mar Negro, pra a praia, ver as romenas de top-less (sim, lá é comum, e ficaram surpresas quando eu disse que no Brasil não fizessem isso). Mas essas são histórias para o post seguinte ;-)

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Chegando à Romênia: Em Bucareste

Todo romeno é apaixonado pelo Brasil. Uma dessas coisas que a gente nem faz ideia e que descobre de repente. A Romênia, apesar de estar no leste europeu, é um país latino, e a língua falada (o romeno) é parecido com o italiano. Eles tem um pouco daquele ar desconfiado típico do leste europeu ex-comunista, mas em geral são mais calorosos, engraçados, e  como os brasileiros  tem um certo jeito malandro e sabem fazer piada mesmo quando estão na pior.





A Romênia ali no leste, entre a Hungria e o Mar Negro ("Black Sea"). Conta a História que são descendentes dos romanos, que de fato ocuparam aquela região antes dos eslavos. Daí o nome do país (Romênia) e um idioma que é, dentre todos, o mais próximo do latim. Dizem alguns linguistas que é também o mais próximo do português.

Na Romênia eu fiquei hospedado na casa do Seu Vlad, pai de uma amiga minha. Não conheci o dito-cujo, pois estava viajando, mas a mãe tratou de colocar meu estômago em ordem depois da penúria alimentar que foram a Bielorrússia e a Ucrânia. Boa comida! Apesar de a cozinha romena ser bastante à base de carne, eu como vegetariano recebi tratamento especial, hehe. Além de bolo de damascos, doce de cerejas comuns, brancas, pretas... uma beleza. As coisas em geral tem mais tempero e tem mais gosto.

Como eu disse, todos os romenos parecem ser apaixonados pelo Brasil. Na cabeça deles o Brasil é uma terra mágica de clima quente, gente alegre, natureza bela, festa... (peraê, e não é que é mais ou menos isso mesmo? hehehe mas eles sabem pouco sobre a violência urbana, desigualdade social etc.). As novelas da Globo aqui são um sucesso, e anúncios com os rostos de Gisele Bundchen e Adriana Lima estão por toda parte na cidade.

Eu fiquei em Bucareste, a capital, cidade de 2 milhões de habitantes  de um país que tem 22 milhões e é mais ou menos do tamanho do estado de São Paulo. A cidade não é tãão encantadora assim; em sua maior parte foi bombardeada na Segunda Guerra. A Romênia tinha um regime fascista durante a guerra e entrou do lado de Hitler contra a União Soviética. O exército romeno na verdade foi o principal aliado da Alemanha no front oriental (invasão da Rússia etc.), mas na escola a gente nunca estuda essa parte e praticamente ignora os países da Europa oriental, perdendo muito da História. O resultado é que Bucareste foi bombardeada pelos Aliados e hoje a maior parte dos prédios são da era comunista, quando a Romênia virou parte da "cortina de ferro" de países-satélite da União Soviética (a Romênia nunca foi parte da URSS em si, ao contrário da Ucrânia e da Bielorrússia). De quebra, eles tiveram a partir dos anos 60 um ditador comunista maluco que quis homogeneizar a cidade e derrubava qualquer prédio que parecesse burguês, Nicolae Ceausescu. A família da minha amiga, nos anos 80, recebeu o aviso de que em três dias o prédio seria demolido e teriam de se mudar pra outro loteamento. Agora imagine aí.

Esse senhor Ceausescu era megalomaníaco, e construiu para si próprio um Palácio do Governo que é simplesmente o segundo maior prédio institucional do mundo - atrás do Pentágono. Eu fui visitar o lugar. Há mais de 1.000 salas, os salões são enormes, e em alguns deles dá até pra jogar futebol. Pra vocês terem uma ideia, são em torno de 250m x 250m de prédio, 86m de altura e 92m de subterrâneo. Muito patriótico, ele exigiu que se utilizassem somente materiais extraídos da própria Romênia (mármore, madeira, ouro, etc.). Vejam algumas fotos aí abaixo.
Visão da frente do prédio do governo, que é o parlamento e abriga também outras instituições.
Escadaria no salão principal de entrada.


Este salão de reuniões hoje é utilizado para conferências oficiais, reuniões de governo, encontro de ministros da União Europeia, etc.
Balaustrada do palácio, de frente para avenida. O primeiro a fazer um pronunciamento público aqui foi... Michael Jackson, que gritou à multidão de romenos: "I love Budapest!!". Oops, deu mole, Michael, Budapeste é na Hungria.
No mastro central a bandeira da Romênia. À esquerda, a bandeira azul da União Europeia, da qual a Romênia é parte desde 2007.

O dito-cujo Ceausescu morreu sem ver o palácio terminado. Depois de governar a Romênia com mão de ferro desde 1965, foi assassinado em 1989 na noite de Natal.

Mas como a Romênia não é só Bucareste. É também aqui na Romênia que fica a famigerada Transilvânia, a terra do Drácula. O conto se baseia num indivíduo real, um príncipe da região e que era conhecido por ser deveras sanguinário. Morava na Transilvânia, que é uma das províncias romenas (as outras sendo a Valáquia, onde fica Bucareste, e a Moldávia). A Transilvânia fica na bela região montanhosa dos Cárpatos, com florestas entre as colinas e tudo o mais. Mas a ida à Transilvânia fica para o próximo post.
Antes da Segunda Guerra, Bucareste era conhecida como "A Paris do Leste". E voilà, eis o Arco do Triunfo de Bucareste. É basicamente igual ao de Paris, só que este aqui é mais novo. Enquanto que o francês foi feito pra celebrar as vitórias de Napoleão por volta de 1806, o romeno celebra as vitórias e conquistas territoriais sobre o Império Austro-Húngaro após a Primeira Guerra Mundial. O estilo, porém, é bem semelhante.
Típicos boulevards comunistas. Ruas amplas e arborizadas, mas prédios de concreto sem muito charme.
Vizinhança onde fiquei em Bucareste,
Alguns prédios de antes da Era Comunista e que permaneceram. Teatro Odeon.
Igreja católica em Bucareste, embora a larga maioria dos romenos - e das igrejas em Bucareste - sejam ortodoxos.