quinta-feira, 25 de julho de 2013

São Jorge, o sorvete turco e o vale do amor

Sim, aquilo é sorvete. Mais abaixo eu explico.

Meu relógio marcava 5:29 da manhã quando o grito de "Allaaaaaahu akbar" soou do minarete ao lado do meu hotel. Aquela voz de megafone. Eles não gravam; todo dia, 5 vezes, vem mesmo alguém chamar o povo à oração. Os dizeres prosseguem por um minuto ou dois, exaltando Allah e clamando a todos que venham. É impressionante, mas me levantou meio que de supetão nesse horário.

Por outro lado, foi bom. Meu despertador tocaria às 5:30 de qualquer jeito. Às 6:00 o baloeiro deveria chegar, e o carinha do hotel me avisar. Sim, Mairon afinal topou pagar os 450 reais para viajar uma hora de balão. Nunca mais me chamem de pão-duro. O único mal foi que, bem, no fim das contas Mairon não voou de balão. Às 5:50, eu havia acabado de sair do banho, o carinha bate à minha porta com cara de sono pra me dizer que as saídas de balão foram canceladas devido ao mau tempo. (Raios! Raios múltiplos! ... mas uma semana depois, na Bulgária quando o meu cartão parou de funcionar, eu seria muito grato a esse mau tempo por me deixar com algum dinheiro no bolso).

Bom, era hora de reprogramar o dia. Além do passeio que eu fiz ontem (o chamado "tour verde", pra quem tiver pretensões de vir), há o "tour vermelho", mas que cobre basicamente lugares próximos, onde você pode ir por conta própria se gostar de andar. É o meu caso, então preferi economizar meus 80 reais (preço aproximado de cada passeio). Mas primeiro, era preciso ir à agência dos baloeiros pegar o meu dinheiro de volta.

Aproveitei pra tomar café e ver um pouco mais da cidade de Goreme, que é muito bonitinha e merece pelo menos algumas horas batendo perna. Os preços também não são maus. E nisso tudo me perguntei se não veria mesmo absolutamente nada de São Jorge. Já advirto a quem vier que: não, exceto por alguns afrescos em meio a muitas pinturas rupestres nas cavernas, não há absolutamente nada a São Jorge aqui. A procura parece ser sobretudo por parte de brasileiros, já que no Brasil é feita uma associação forte de São Jorge com a Capadócia, e há até a música de Jorge Ben. Numa loja, ao saber que eu era brasileiro, um menininho correu lá dentro e buscou uma imagenzinha de São Jorge e me deu de presente, que guardo até hoje. Tem o nome do santo escrito em português, então você já vê pra que público é. Na historiografia, na verdade não se sabe ao certo se São Jorge nasceu na Capadócia ou na Palestina, em Lida (ou Lod), hoje Israel, onde há desde o séc XIX uma Igreja de São Jorge que diz ter um sarcófago com os restos mortais dele. Jorge nasceu de pais gregos cristãos e entrou cedo para o exército romano, sendo decapitado aos portões de Nicomédia em 23 de abril de 303 quando Diocleciano, o imperador da época, quis banir o cristianismo do exército.

(Pra quem gosta de história: no ano 302 DC Diocleciano decretou um édito dizendo que todos os soldados cristãos deveriam ser presos e forçados a fazer um sacrifício aos deuses romanos e abandonar a fé cristã. Jorge se recusou, aborrecendo Diocleciano, que ao mesmo tempo não queria perder um dos seus bons capitães (tribunus militum) e nem um oficial de patente ainda maior, o pai de Jorge, Gerontius. Jorge, no entanto, declarou publicamente que recusava, e recusou até mesmo ofertas de dinheiro, terras e escravos dadas por Diocleciano para que ele aceitasse. Diante da obstinação de Jorge, Diocleciano ordenou que o torturassem. Diz a lenda que Jorge foi ressuscitado três vezes durante as torturas por laceração, de modo que não houve outro modo senão decapitá-lo. Já a lenda do dragão foi trazida pelos Cruzados, que a aprenderam entre a hoje Turquia e a Palestina, e a associação era do dragão com o mal. Já as ocasionais associações de São Jorge com a lua são sobretudo brasileiras, talvez pelas paisagens da Capadócia...).
Café em Goreme.
Ruazinhas no centro de Goreme.

O dia estava fechado, com um breve chuvisco e meio frio. O agenciador de baloeiros  que falava um poquinho de português e me contou como havia sido assaltado duas vezes no Parque do Ibirapuera  sugeriu que eu comprasse na mão dele um passeio a um hamam, o tradicional banho turco. O hamam é como um spa de banhos termais, num lugar fechado, em que mulheres e homens são separados e você é tratado meio que como um sultão: alguém vem ensaboar você, escovar seu corpo, fazer massagem etc. Te põem até óleo de rosas se você quiser. As mulheres normalmente ficam nuas, e os homens vestem um pano amarrado nas partes baixas (como lutador de sumô). Só que é segregado, então é homem com homem e mulher com mulher. Desculpem-me, mas a perspectiva de ter um turco peludo e barrigudo me ensaboando não é exatamente o que me atrai. Perguntei de sacanagem ao cara se não teria jeito de ter uma turca fazendo a massagem, e ele me olhou com aquela cara de "Alow?! Cê tá louco?". Eu só ri, e devolvi com a cara de "então não, obrigado". Peguei o meu dinheiro do balão e fui embora.

Meu destino pela manhã era o Museu Aberto de Goreme (Goreme Open Air Museum), uma área com muitas grutas e mais pinturas rupestres a uma meia hora dali a pé. A caminhada parece que você está no nada, e não havia uma viv'alma, exceto por um grupo de cavalos que encontrei  pra honrar o nome da Capadócia. Sério mesmo, parece que você está num outro planeta, tipo Tatooine ou algo assim. E pra aumentar ainda mais a minha impressão encontrei uma fazendinha de ETs.
Cavalos na Capadócia. As únicas viv'almas a serem encontradas nesse descampado.
Casinha de ETs. Não me pergunte o significado disto.

A entrada do Museu Aberto não é difícil de achar, pois logo você avista os vários ônibus turísticos parados. Além disso, há um "corredor turco" de barracas e lojas pelo qual você passa para chegar à entrada. A bem da verdade, vou confessar a vocês, esse corredor foi mais interessante que o museu em si. Como no Brasil (e diferente de muitos outros países), aqui você pode facilmente puxar papo com o(a) vendedor(a) mesmo que não compre nada. Foi útil pra me informar sobre o que há de bom na música turca, ouvir alguns CDs e trocar charme com as vendedoras.  

Além disso, fiquei finalmente conhecendo o famoso sorvete turco (chamado dondurma), que é diferente do habitual. O sabor é parecido, mas sua textura é mais densa e firme. Como resultado, ele é bem mais difícil de derreter  e permite ao vendedor ficar fazendo malabarismo com o cone ou até tirar o bloco de sorvete inteiro do pote, como na foto inicial desse post. Ele usa uma vara de metal (como se fosse uma lança) em vez da típica colherzinha, já que requer um pouco mais de força. Mas, minha opinião? Uma delícia. E até mais gostoso que o habitual.

Se você estiver se perguntando como fazem, eles adicionam como espessantes uma resina natural obtida da planta do pistache e salep, uma farinha de raiz de orquídea roxa. (Diz a lenda que na região de Kahramanrash, no sudeste do país, se faz um com ainda mais salep, e que se come com garfo e faca)
Corredor de lojas à entrada do Museu Aberto de Goreme.
Vendedor animado suspende o sorvete turco.
Vendedor fazendo malabarismo com o sorvete, que dificilmente cai da casquinha.

Já o Museu Aberto foi um pouco mais do mesmo: mais cavernas, rochas a se subir, e pinturas rupestres. É legal, mas se você ver demais começa a ficar repetitivo. A graça foi ver um senhor português irritado, durante uns 10 minutos fazendo a mulher bater direito a foto, e reclamando que estava torto (àquela maneira portuguesa, bufando e dizendo "Máix náo é pussívl"), e posando novamente, e de novo... haha.
Português tentando sair bonito na foto.
Museu Aberto de Goreme
Vista da entrada de uma caverna.

No passeio encontrei uma indiana e uma japonesa (naquela de "tira uma foto pra mim?"), e acabamos por retornar à cidade juntos para almoçar. Tentamos pegar um suposto ônibus a um vale mais longe (calma, isso não era nenhuma maracutaia minha) seguindo info do guia da japonesa, mas tudo o que obtivemos depois de algum tempo de espera foi um carro suspeito com dois turcos perguntando aonde nós íamos e oferecendo carona. A japonesa, inocente como parece ser típico, ficou animada e já ia entrando. A indiana e eu, muito mais espertos para o lado de malandragem, nos entreolhamos e mandamos os turcos seguirem. Ficaram até esquentados, mas deram o fora. Resolvemos ir almoçar.

Nosso prato foi um kebab (que nas ruas da Europa é uma carne de quinta, mas que aqui na Turquia é um preparado ao molho super saboroso, que pode ser de bife, frango, ou até vegetariano) feito na moringa de barro. À mesa o garçom quebra e serve. Uma maravilha.
Kebab na moringa de barro.
Garçom serve o kebab após quebrar a moringa com cuidado.
Kebab vegetariano, com batatas, berinjela, ervilha, tomate e outros legumes num molho. Uma ma-ra-vilha.

Após a refeição, acabamos tomando rumos diferentes. A indiana iria se encontrar uma amiga, a japonesa queria ver algo que eu já tinha visto, e eu iria sozinho ao Vale do Amor. Esse é outro ponto famoso da Capadócia, embora mais distante. Dá coisa de 1h de caminhada de Goreme -- isto é, se você souber direito o caminho. Se você não souber, como eu, leva 2h. Sei que eu me perdi bonitinho, mas depois de muito vagar por aquele descampado, consegui achar o caminho à beira de uma rodovia, depois subindo uns montes.
Caminho para o Vale do Amor.
Deixando a beira da rodovia e seguindo pela estrada de chão.
Subindo a caminho do Vale do Amor.

No caminho, encontrei somente alguns poucos turistas voltando  pois já era final de tarde  e que me confirmaram que o caminho era por ali mesmo. Mas só até a rodovia. Depois, só encontrei um casal humilde, já de certa idade, que tinham estado vendendo suco de laranja numa barraca improvisada no meio do nada.

E o que tinha nesse tal do Vale do Amor, você deve estar a se perguntar. Nenhuma princesa encantada e nem fonte de água mágica prometendo sorte no amor a quem dela bebesse. Vou mostrar a foto e vocês tentam adivinhar o porquê do nome.
O Vale do Amor.

E aí, sacaram o porquê do nome? Vale do Amor é devido ao formato peculiar dessas enormes rochas ao longo de todo o vale. Não preciso dizer com o que elas se parecem. (Pensou que fosse algo mais romântico, hein).

Depois dessa jornada pra registrar, era fazer o caminho de volta a Goreme e esperar pelo meu novo ônibus. À noite mais 12 horas de Suha me aguardavam, com direção a Istambul.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Na aridez da Capadócia

"Olhos do Egeu", típicos na Grécia e na Turquia para afastar o mau olhado. E a paisagem lunar da Capadócia ao fundo.

A Capadócia recebeu seu nome dos antigos persas: Katpatuka, ou "terra dos belos cavalos". Hoje poderia-se chamar também "a terra dos belos enrolões", mas nesse quesito não é muito diferente das outras áreas turísticas da Turquia. O diferencial da Capadócia está mesmo nas paisagens (das mais impressionantes da Turquia), nas catacumbas antiquíssimas e no famoso passeio de balão. Não é para os claustrofóbicos nem para quem tem medo de altura  e haja pernas.

Cheguei lá logo de manhãzinha, vendo o nascer do sol da janela do ônibus. Meu destino era a cidadezinha de Goreme, centro do turismo na Capadócia. A região é ampla (como a Chapada Diamantina na Bahia), e basicamente você depende de pacotes turísticos diários que te levam às formações rochosas, às catacumbas, etc. Então passei nas agências de turismo antes mesmo de seguir para o meu hotel, um lugar simples estilo pai-e-filho-tomando-conta. O pai era um estressado anti-social e o filho um sujeito taciturno de olhos vermelhos em plena manhã, quando me recebeu. Se era conjuntivite ou fumo eu não sei. Só sei que ele, é claro, tentou me vender logo os passeios -- mais caro do que eu encontrei no centro. Recusei. Disse que ia ainda conhecer a cidade primeiro.

Mas a tentação permaneceu. O dia estava bonito, e eu estava animado pra já ver o que de melhor a Capadócia teria a oferecer. Retornei na agência mais barata (já que os passeios são idênticos, independente de onde você o compre) e perguntei se ainda dava tempo. Dava sim: um saía às 8:30h, e era só tempo de tomar um café veloz e sair. Saí pelo centro à procura de algum restaurante aberto.
Amanhecer na aconchegante cidadezinha de Goreme, em meio às rochas, na Capadócia.
Olhem a generosidade do meu iogurte de cabra com mel no café da manhã em Goreme.

Quase tudo ainda estava fechado às 8h da manhã em Goreme. Consegui somente um restaurante, onde o dono estava arrumando as cadeiras mas aceito me atender e me serviu um omelete com essa beldade de iogurte aí em cima.

Pouco tempo depois chegou o nosso microônibus. O nosso guia era um sujeito tímido e simpático que se apresentou como "Éfe". Já o passeio se revelaria uma mistura de colinas e subterrâneo, com uma caminhada por um  impressionante vale verde no meio da paisagem árida, e muitas das chamadas "chaminés de fadas" nas rochas (vocês vão ver). Mas antes de eu mostrar qualquer coisa, deixem-me dizer que a Capadócia parece uma terra de ninguém, com vastas superfícies desertas e sem cara de presença humana. Você se sente em algum filme de fantasia, de lenda, e se tiver a imaginação fértil vai começar a visualizar como poderiam viver gigantes ou anões naquelas colinas, ou que a qualquer momento vai se deparar com alguma criatura sombria saindo daquelas cavernas.

Confiram abaixo as paisagens de que estou falando. A região é semi-árida e tem em média 1000m de altura, toda formada por depósitos rochosos de atividade vulcânica de milhões de anos. As rochas foram se quebrando e se erodindo com a ação da água ao longo do tempo, e as mais duras permaneceram em formatos diversos. Há uma grande quantidade de rochas relativamente macias na região, então desde a antiguidade se cavaram moradas, refúgios e túneis nas colinas e no subterrâneo.
Paisagem rochosa da Capadócia.
A imensidão quieta.
Catacumbas com até cinco níveis de profundidade. Cavadas pelos hititas, povo que habitava esta região por volta de 1300 AC. Havia sistemas de comunicação entre os vários andares, áreas de guardar alimentos, e se estima que aqui podiam se esconder durante meses se necessário.
Vários dos túneis miúdos das catacumbas. É preciso andar todo encurvado ou feito pato, com as pernas dobradas. E essa iluminação toda é só por causa do flash da câmera...
... na realidade é assim. E em algumas partes você literalmente não vê a luz no fim do túnel, e tem que caminhar só na fé de que tem saída.
O Vale de Ihlara, um incrível cânion verde em meio à aridez.

A partir dos anos 300 DC houve forte presença monástica na Capadócia, com a construção de igrejas rupestres, muitas aqui no Vale de Ihlara. Muitas dessas pinturas rupestres continuam incrivelmente bem preservadas (mas não pode tirar foto), e o vale em si é lindo. São 100m de altura e uns 14km de extensão. Descemos ele todo a pé, e caminhamos por uma meia hora até onde seria o nosso local de almoço. Há um pequeno rio percorrendo o vale, e o ar é bem mais fresco que lá em cima. Em meio à vegetação e à água você vê aves e ovelhas, e nos paredões dezenas de entradas para cavernas.
Local do almoço no Vale de Ihlara.
Mesas ao rio e patos circulando (provavelmente sem noção do risco de serem afanados pelo cozinheiro). A sensação do ambiente é como você deve imaginar: agradabilíssima.
Várias grutas e cavernas pelas laterais do vale.
E olha quem eu encontrei por lá. O Felipe Folgosi, ator, também passeando.

Após o almoço fizemos mais uma caminhada no vale para fazer a digestão, e subir de novo é que foi o martírio. (Uma senhora amazonense meio pesada que estava conosco foi que sofreu, coitada). Ainda tínhamos pela frente as cavernas que parecem um formigueiro gigante e o "Vale dos Pombos". No caminho, a amazonense e seu marido estavam me persuadindo a fazer o passeio de balão, dizendo o quanto era legal, etc e tal. Mas eu estava relutante. Não me conformava que 1 hora de passeio de balão custasse  eu aprecei  o equivalente a quase 450 reais por pessoa. Só se eu achasse alguma mina de ouro aqui nessas cavernas.

As cavernas me lembraram Os Trapalhões na Terra dos Monstros. Eles dizem que aqui foram filmadas algumas cenas de Tatooine do Guerra nas Estrelas (com o "povo da areia"), mas não é verdade, essas foram filmadas na Tunísia. Mas que lembra, lembra. Já o Vale dos Pombos rende uma caminhada, mas somente o observamos do alto, pois não havia mais tempo. Meu dia de sair andando à deriva por conta própria seria amanhã  (fazer isso tem sempre um gostinho especial de liberdade). E, quem sabe, no fim das contas eu fizesse o tal passeio de balão...
Formigueiro gigante?
Zanzando pelo interior das cavernas.
Visitantes na masmorra.
Paisagem com essas formações rochosas.
Sentado com o Vale dos Pombos ao fundo. Parece montagem mas não é.


quarta-feira, 10 de julho de 2013

De Pamukkale à Capadócia

Vista da Capadócia (ou seria a lua?)

Saindo de Hierápolis, deixando ali as ruínas dos césares, fui ver a cidadezinha de Pamukkale. Bastante simples, e com o centro mais bonitinho do que as ruas de terra que eu vi à noite. Fui comer. Na própria área turística entre as ruínas de Hierápolis e as formações calcárias, só havia lanchonetes, restaurantes caros (que Mairon, por definição, evita), e piscinas pagas que estavam sendo usadas basicamente pelos turistas russos. Por mais tentado que eu estivesse a me imiscuir junto às russas na piscina, elas parecem quase sempre viajar em casal, e piscina se acha em qualquer lugar. Tomei um suco de romã e fui embora.
Centrinho de Pamukkale, com lojas e restaurantes simples (daqueles em que o dono mora no andar de cima).

Pra quem torceu o nariz pra o suco de romã, saiba que não é aquela fruta demoníaca, amarga, que a fama diz. Aqui nessa parte da Turquia tem pé de romã pra toda parte, e vende por toda parte igual a suco de laranja aí no Brasil. É azedinho e forte. Mas, tal qual limonada concentrada, dá mais fome ainda. Entrei num restaurante e fui pro andar de cima onde havia varandas, num lugar bem agradável. Como já havia passado um pouco do horário do almoço, estava vazio. Só duas garotas japonesas almoçavam, discretas como de praxe.

Tirei a barriga da miséria. A propósito, devo dizer que em geral comi muito bem na Turquia. Pedi uma espécie de pão chato assado com queijo, tomate etc e especiarias em cima, e pedi uma sobremesa de iogurte de cabra com frutas que mais parecia outra refeição.
Ambiente do segundo andar do restaurante, com tapetes decorando e as varandas dos lados.
Pães chatos com recheios de queijo, tomate e especiarias. Lembra uma pizza, mas com mais especiarias. Ali no potinho é uma chamada sumak (usada tanto pra cozinhar quanto pra pôr no prato), típica nas cozinhas árabe, persa e turca. O gosto é levemente ardido, e meio azedinho..
Minha magavilhosa sobremesa: iogurte de cabra com frutas e mel. Comeria todo dia.

Eu já estava na sobremesa quando as japonesas pediram a conta e foram congratuladas com uma performance do dono, um obeso, dançando Gangnam Style. Ele fazia os movimentos com dificuldade, devido ao peso, e só sabia o refrão, mas dava os pulinhos com uma empolgação invejável. As japonesas tentaram  uma vez, e baixinho  dizer que a música era coreana, mas de nada adiantou.

Ainda no centro, fui comprar uma toalha de banho e uma de mesa. Não é que eu tivesse a intenção de comprar, mas aqui na Turquia os tecidos são tão de babar que, mesmo sem querer, você compra. O vendedor me perguntou se minha mesa era de 1,5m ou de 2m e eu não sabia. (Na verdade, eu nem tinha exatamente uma mesa em mente em que pudesse pôr). Mas mesmo assim comprei pra deixar guardada... a mesa eu compro depois, uma sirva pra a toalha.

Comprei também minha passagem de ônibus para a noite, pois era hora de seguir para a Capadócia. Mas desta vez seria uma viagem mais longa, então o ônibus só chegaria lá de manhã. Fui para o hotel pegar minhas coisas e fiquei de papo com um mexicano. Ficamos trocando impressões sobre a Turquia e chegamos à conclusão de que os turcos se parecem muito com os latino-americanos, na aparência como no comportamento. Só que os turcos são mais pavio-curto e tem menos jogo de cintura e molejo pra lidar com as coisas do que nós. Ao menos é a minha percepção. Mas são muito animados e calorosos.

A viagem à Capadócia foram, literalmente, oito horas de Suha. Suha é o nome da companhia, e surrado é como você se sente depois de chegar. O ônibus tem tudo: ar condicionado, televisão individual às costas da poltrona da frente, e até serviço de bordo com biscoito e cafezinho servido por uma "rodo-tia" (uma versão rodoviária e coroa da aeromoça). Só não tem banheiro. Portanto o ônibus faz paradas a todo momento naquelas lanchonetes de beira de estrada, parecidas com as do Brasil (só que aqui na Turquia o banheiro é pago, mas também é um tanto mais limpo).
Sendo "Suhado", com minha televisãozinha que eu não entendia nada
e uns lanches internacionais: Lipton tea e Pringles. 

Continua, após a noite de Suha.